- Atualizado há 2 dias
Em 9 de janeiro de 1963, duas cientistas do Smithsonian National Museum of Natural History, a batracologista Doris Cochran e a entomologista Doris Blake, registraram em seu diário de campo a captura de dois sapos em um “grande campo cheio de cupinzeiros e tufos de grama mastigados por vacas”, nos arredores de Tarumã, na época uma área rural de Curitiba, no Paraná.
À época, a paisagem era formada por riachos, campos abertos e áreas alagadas. Hoje, o bairro Tarumã é densamente urbanizado, com ruas asfaltadas, prédios e comércio — um ambiente onde a presença do pequeno anfíbio seria impossível.
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O exemplar coletado revelou uma surpresa: pertencia ao gênero Dryadobates, até então considerado restrito a apenas uma espécie na Mata Atlântica. O material, catalogado como USNM 148487, estava guardado no Smithsonian. A dúvida sobre a origem do animal perdurou por décadas, mas foi esclarecida recentemente pelo batracologista Taran Grant, da USP, que confirmou a autenticidade e a classificação da espécie como Dryadobates erythropus.
O animal, um macho de apenas 13,5 mm, estava ressecado e quebradiço, indicando que morreu ainda dentro do saco de coleta. Apesar da impossibilidade de extrair DNA, a morfologia foi suficiente para a descrição da espécie, que se tornou o holótipo — o exemplar de referência para a classificação formal.
O epíteto “erythropus”, que significa “pé vermelho” em grego, homenageia os trabalhadores rurais do Paraná conhecidos como “pés-vermelhos”. Estudos indicam que, se vivo, o sapo teria hábitos semelhantes aos parentes próximos, vivendo próximo a riachos, com comportamento reprodutivo delicado e cuidado parental marcante, características que lhe valeram o apelido de “nurse frog”, ou rã-enfermeira.
Para Grant, a descoberta sugere que outras espécies intermediárias entre o Rio de Janeiro e o Paraná podem ter existido e desaparecido sem registro formal. Ele destaca a importância de coletar dados sobre história natural, distribuição e abundância local das populações existentes de Dryadobates, a fim de identificar ameaças e preservar a biodiversidade da Mata Atlântica.