O dólar apresentou alta firme nesta terça-feira, 4, e fechou perto do nível psicológico e técnico de R$ 5,30, nos maiores níveis desde fins de março do ano passado. O real sofreu em conjunto com divisas emergentes, em dia marcado por nova rodada de queda de preços das commodities, em especial de petróleo e minério de ferro.

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Analistas veem um desmonte de apostas em moedas emergentes que tem como gatilho o tombo do peso mexicano, em meio a temores de mudança da política econômica no México.

A candidata governista Claudia Sheinbaum não apenas levou o pleito como conquistou ampla maioria no Congresso, o que abre as portas para a mudanças constitucionais.

Já fragilizado recentemente pelos arranhões na credibilidade da política fiscal e monetária, o real não apresentou nesta terça o pior desempenho entre seus pares. Além do próprio peso mexicano, o rand sul-africano e o peso colombiano tiveram desvalorizações mais acentuadas.

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Com máxima a R$ 5,2961 à tarde, o dólar à vista encerrou o pregão em alta de 0,98%, cotado a R$ 5,2854 - maior valor de fechamento desde 23 de março de 2023 (R$ 5,2900). Em 2024, a moeda americana já acumula valorização de 8,90% em relação ao real.

O sócio e diretor de gestão da Azimut Brasil Wealth Management, Leonardo Monoli, afirma que há uma mudança nas expectativas para os emergentes com as eleições no México e também na Índia, após o desempenho abaixo do esperado do primeiro-ministro Narendra Modi.

Monoli ressalta que o peso mexicano era a ponta "long" (comprada) da grande maioria dos "trades de carrego" - ou seja, investidores se financiavam em moedas de países com juros baixos, em especial o iene, para apostar na valorização da moeda mexicana.

"Pode e deve haver uma mudança para um governo mais gastador no México, que vai ter maioria no Congresso. A rúpia também sentiu com um novo governo mais enfraquecido na Índia. Isso aumentou o alarme em torno de emergentes", afirma Monoli. "Nestes dias, estamos assistindo um grande desmonte de 'carry trades', e isso acabou arrastando praticamente todas as moedas".

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O economista-chefe do Banco Pine, Cristiano Oliveira, ressalta que o peso mexicano e o real eram as grandes apostas dos investidores estrangeiros no fim do ano passado, diante da expectativa, à época, de corte de juros nos EUA ainda no primeiro semestre.

"O real sofreu antes porque houve decepção com a agenda doméstica, principalmente com o fiscal, e agora é a vez do peso mexicano passar por uma reavaliação. Com isso, o apelo das divisas emergentes caiu muito. Há uma reavaliação das carteiras", diz Oliveira, ressaltando que dados recentes da economia chinesa também deprimiram os preços das commodities, o que prejudicou o real.

Em relação a moedas pares, o dólar teve leve alta na comparação com o euro e forte baixa ante o iene e o franco suíço. O índice DXY rondava a estabilidade no fim da tarde, ao redor dos 104,120 pontos. As taxas dos Treasuries recuaram em bloco e, nas mínimas, tocaram nos menores níveis em três semanas.

Nos EUA, relatório Jolts mostrou abertura de postos de trabalho abaixo do esperado nos EUA em abril, o que levou a aumento das expectativas de corte total de 50 pontos-base pelo Federal Reserve neste ano. Na quarta, sai o relatório ADP de emprego privado em maio e na sexta-feira, 7, o relatório oficial de emprego (payroll).

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Para Oliveira, do Pine, o mau humor com as moedas emergentes pode começar a se dissipar quando se consolidar a aposta em um afrouxamento monetário consistente nos EUA. "Pensando no ano que vem, o peso mexicano e o real podem se apreciar com uma sequência de cortes de juros nos EUA. Um ou dois cortes, como já é esperado, não bastam. Até lá, não vejo muito refresco", afirma o economista.

Pela manhã, o IBGE informou que o PIB subiu 0,8% no primeiro trimestre em relação ao quarto trimestre de 2023, acima da mediana do Projeções Broadcast (0,7%) e com aceleração da demanda doméstica. Esse quadro reforça a perspectiva de provável interrupção do processo de corte da taxa Selic já na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) neste mês.

A manutenção de uma taxa de juro real elevada, contudo, não consegue dar sustentação ao real em meio à piora do sentimento em relação a emergentes e ao desconforto crescente dos investidores com os rumos do governo Lula.

Monoli diz que as expectativas seguem se deteriorando com "grade preocupação" em relação à política fiscal. Há também arranhão na credibilidade do Copom após a decisão divida em maio, quando diretores indicados pelo governo Lula votaram por redução menor da taxa Selic.

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"A troca de comando no BC na virada do ano traz muita insegurança, com preocupação de atuação mais 'dove' a partir de janeiro de 2025", afirma o gestor, em referência à substituição do atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, acrescentando que os preços das commodities não ajudam as exportações e a sazonalidade positiva do fluxo cambial pelo lado comercial se encerra na metade do ano. "Possivelmente o dólar pode não ser somente um problema nesta semana, mas um problema para boa parte do próximo semestre."