- Atualizado há 3 horas
Quando perdeu parte da pata devido a um câncer, Gorda, uma galinha resgatada, recebeu uma nova chance de se locomover com auxílio de uma prótese desenvolvida especialmente para ela por integrantes dos laboratórios Engenhar-MEC e 3D Life Lab. Conduzido pelo projeto de extensão Engenhar-MEC da Universidade Federal do Paraná (UFPR), a iniciativa tem como objetivo propor alternativas de baixo custo para tecnologias assistivas, utilizando manufatura aditiva, popularmente conhecida como impressão 3D.
Esse é apenas um dos muitos casos que ilustram como a tecnologia pode ser aplicada em benefício do cuidado animal. Além da galinha, o projeto já atendeu cachorros, gatos, um marreco e até uma ovelha, proporcionando mais qualidade de vida, autonomia e inclusão a animais com deficiência.
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No Engenhar-MEC, os professores Sérgio Fernando Lajarin, do Departamento de Engenharia Mecânica, e Maria Fernanda Torres, do Departamento de Anatomia, atuam com alunos extensionistas no desenvolvimento de produtos de tecnologia assistiva de baixo custo, como próteses, órteses personalizadas e carrinhos de locomoção.
A aplicação veterinária das tecnologias assistivas teve início a partir de um pedido recebido no perfil do laboratório no Instagram, envolvendo o caso do cachorrinho Bento, que nasceu com uma malformação em uma das patas. A condição poderia gerar consequências como desvio na coluna vertebral e sobrecarga em outras articulações, o que motivou os professores a desenvolverem uma órtese específica para o animal.
Com a divulgação da história de Bento nas redes sociais, novos casos começaram a ser encaminhados ao projeto, além daqueles identificados pelo Hospital Veterinário da UFPR. Cada animal apresenta particularidades e demandas específicas.
O processo começa com a moldagem, geralmente feita com atadura gessada. Em seguida, o molde é digitalizado e convertido em um arquivo tridimensional, sobre o qual a prótese ou órtese será modelada utilizando softwares específicos. Após essa etapa, realiza-se a impressão 3D, normalmente em filamentos termoplásticos. “No planejamento da impressão, todos os parâmetros são ajustados para definir características como resistência, flexibilidade e peso”, explica Maria Fernanda.
Segundo Lajarin, o desenvolvimento das soluções leva, em média, 15 dias. “Em geral, utilizamos filamentos plásticos, sendo os mais comuns o PLA, PETG e TPU, este último com propriedades flexíveis. Os materiais e os equipamentos são fornecidos por uma empresa privada parceira do projeto, o que permite que os produtos sejam disponibilizados sem custo para os tutores dos animais”, conta o professor de engenharia.
Cada caso, uma solução personalizada
Gorda foi adotada por uma pessoa que se sensibilizou com as condições em que ela vivia e concedeu a ela o papel de animal de estimação. Extremamente dócil, ela foi atendida pelo setor de animais selvagens do Hospital Veterinário da UFPR devido a lesões no pé e recebeu o diagnóstico de câncer.
Como a lesão não cicatrizava, optou-se pela amputação do membro afetado. “Neste caso, utilizamos um modelo disponível na internet e o adaptamos às medidas do coto. Após testar uma primeira versão, substituímos a extremidade por uma esfera, pois os dedos do modelo original comprometiam a funcionalidade. No dia da instalação, ela se mostrou receosa e caminhou pouco, mas depois recebemos a informação de que se adaptou bem”, relata Maria Fernanda.
Chico é um cão da raça bulldog francês pertencente a uma estudante do curso de Engenharia Mecânica. Ele foi diagnosticado com hemivértebra, uma malformação congênita da coluna vertebral caracterizada pelo desenvolvimento incompleto de uma vértebra, o que resultou na perda da coordenação motora dos membros pélvicos. Para se locomover, o animal precisava se arrastar.
“Após atendimento com um ortopedista do Hospital Veterinário e uso de medicação, Chico conseguiu ficar em pé, embora ainda com pouca estabilidade. Desenvolvemos, então, um carrinho de alumínio e ele saiu correndo pelos corredores do Setor de Tecnologia assim que foi colocado sobre a estrutura”, relembra a professora. Chico experimentando o carrinho feito pelo Engenhar-MEC. Imagens: Engenhar-MEC
A ovelha Vitória pertence a uma residente da área de grandes animais do Hospital Veterinário. Após ser atacada por um cão, sofreu uma mordida no pé que causou uma lesão nervosa, resultando em uma posição de flexão permanente. Com o membro virado para trás, o apoio constante gerava uma ferida na pele que não cicatrizava.
“Moldamos o membro com atadura gessada e desenvolvemos uma órtese com um ‘salto’, a fim de nivelar a altura em relação ao outro membro e proteger a região lesionada. A ovelha passou a utilizar um ‘tamanquinho’, que além de garantir a altura adequada, contribui para a preservação da pele”, afirma Maria Fernanda. Vitória andando com a órtese desenvolvida para ela. Imagens: Engenhar – MEC
Benefícios para alunos e formação interdisciplinar
Para os integrantes do laboratório, o ambiente proporciona um aprendizado enriquecedor, não apenas pelas questões técnicas, mas também pela vivência interdisciplinar. “Estudantes de Medicina Veterinária, por exemplo, aprendem a utilizar softwares de modelagem da engenharia e retomam conhecimentos adquiridos nas fases iniciais do curso, aplicando-os no planejamento de próteses. Além disso, desenvolvem habilidades relevantes para a atuação profissional”, informa a professora.
Bárbara Beatriz Garcia Santos, estudante do 9º período de Medicina Veterinária e participante do projeto, destaca que a integração entre as áreas da saúde e das ciências exatas permite a convergência de conhecimentos complementares, como os aspectos biomecânicos dos animais e o processo de fabricação e design das próteses.
“Aprendi ainda mais sobre a importância de compreender a história e a individualidade de cada animal. A iniciativa também favorece a proximidade com o paciente e com o tutor, o que proporciona aprendizados significativos sobre ética profissional e respeito ao indivíduo atendido. Esse contato contribui para o desenvolvimento de uma visão crítica em relação ao planejamento e às condutas adotadas em cada situação clínica”, complementa a estudante.
*Com informações da UFPR