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A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) aprovou, nesta quarta-feira (5), em segundo turno, a concessão do título de Cidadão Honorário de Curitiba a Toni Reis, educador, fundador do Grupo Dignidade e atual presidente da Aliança Nacional LGBTI+. A proposta, de autoria da vereadora Laís Leão (PDT), recebeu 17 votos favoráveis e 10 contrários, confirmando a homenagem concedida no dia anterior, quando o projeto havia sido aprovado por unanimidade, com 23 votos sim, na presença de Toni Reis em plenário.
A Cidadania Honorária de Curitiba é a maior distinção concedida pela Câmara Municipal a pessoas nascidas fora da capital, equivalente ao título de Vulto Emérito de Curitiba, destinado a cidadãos que contribuem de forma relevante para a cidade. Natural de Coronel Vivida, no Sudoeste do Paraná, Antônio Martins dos Reis nasceu em 1964 e vive em Curitiba desde 1984. Casado desde 1990 com David Harrad, tem três filhos adotados — Alyson, Alice e Filipe — e construiu sua trajetória a partir da educação e da defesa dos direitos humanos. Em 1992, fundou o Grupo Dignidade, primeira organização civil do Paraná voltada à promoção dos direitos da população LGBTI+.
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O pedido de reavaliação da homenagem partiu de Guilherme Kilter (Novo), que argumentou que a entidade presidida por Toni Reis, a Aliança Nacional LGBTI+, utiliza instrumentos judiciais para influenciar decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e derrubar leis municipais e estaduais aprovadas em câmaras e assembleias. O parlamentar afirmou que tais ações configuram “ativismo judicial” e que esse tipo de atuação “compromete a autonomia do processo legislativo”.
Em sua fala, Kilter apresentou exemplos de ações diretas de inconstitucionalidade e arguições de descumprimento de preceito fundamental movidas pela organização, entre elas as ADIs 7584 e 7585, que contestaram uma lei do Amazonas sobre a presença de crianças em paradas do orgulho LGBT. Também citou medidas relacionadas à definição de família, à restrição de ensino de gênero nas escolas e à proibição do uso de linguagem neutra.
O vereador criticou ainda a Plataforma do Respeito, iniciativa do Ministério dos Direitos Humanos em parceria com a Aliança LGBTI+, sustentando que o sistema monitora redes sociais e publicações de parlamentares. “Nós não podemos homenagear uma pessoa que ativamente usa de ações no Supremo para derrubar o nosso trabalho legislativo”, declarou. Kilter concluiu pedindo a mudança de voto dos colegas, afirmando que a homenagem “não deveria ser concedida a quem judicializa pautas locais e interfere em decisões tomadas por representantes eleitos”.
Autora do projeto, Laís Leão defendeu em plenário a homenagem e ressaltou a relevância pessoal, acadêmica e social de Toni Reis para Curitiba. “O que estamos reconhecendo é uma história de vida dedicada à inclusão, ao diálogo e ao respeito. Mesmo quem pensa diferente de Toni reconhece que ele atua com serenidade e compromisso com o bem comum”, defendeu a vereadora.
Segundo Laís, a Aliança Nacional LGBTI+, presidida por Reis, é uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos, criada em 2003, que atua legalmente na defesa dos direitos humanos e na promoção de políticas públicas de inclusão. Ela esclareceu que a entidade realiza advocacy, isto é, defesa institucional de causas de interesse coletivo, e não militância partidária. “O Toni é uma pessoa absolutamente adepta ao diálogo e disposta a construir conjuntamente”, afirmou.

A parlamentar rebateu as críticas de que a Aliança praticaria “ativismo judicial”, explicando que as ações citadas por opositores tratam de questões constitucionais e de competência legislativa, não de mérito sobre temas ligados a gênero ou orientação sexual. “Essas ações discutem se câmaras e assembleias podem legislar sobre assuntos que são de competência da União”, pontuou.
Durante o discurso, Laís Leão apresentou o documento público “Posicionamento: o que não queremos e o que não apoiamos”, da própria Aliança LGBTI+, para demonstrar que a organização é contrária a qualquer forma de abuso ou sexualização precoce de crianças. “Somos totalmente contra a pedofilia e a sexualização precoce de crianças e adolescentes, e defendemos que a legislação vigente seja rigorosamente aplicada quanto a atos obscenos em espaços públicos”, citou
Apelos ao diálogo e à imagem institucional da Câmara
Em tom conciliador, Pier Petruzziello (PP) pediu cautela aos colegas e defendeu a manutenção da homenagem, alertando que a reversão da cidadania poderia ser interpretada pela população como um ato de preconceito. “Para fora, vai parecer que nós estamos votando contra o Toni por ele ser homossexual”, afirmou. O parlamentar ressaltou que a Câmara deve zelar pela imagem institucional e pelo respeito às diferenças, especialmente em temas de grande visibilidade pública.
Petruzziello destacou que conhece o trabalho de Toni Reis há muitos anos e que o homenageado “atua com seriedade e diálogo, salvando vidas e promovendo o respeito entre as pessoas”. Ele mencionou ter acompanhado de perto o trabalho do educador com populações vulneráveis, citando o compromisso do ativista com a defesa da dignidade humana e a mediação de conflitos. “Talvez o Toni tenha salvado mais vidas do que todos nós juntos”, declarou o vereador, acrescentando que a trajetória do homenageado representa “um exemplo de dedicação à coletividade e à tolerância”.
O parlamentar também observou que o debate travado em plenário foi legítimo, mas que a Câmara deveria “ter cuidado para não transformar diferenças de opinião em rupturas desnecessárias”. Ele elogiou o comportamento respeitoso de Guilherme Kilter e Laís Leão, mesmo com visões opostas, e afirmou que “a pluralidade de ideias é um valor essencial do Parlamento”. Segundo ele, “a cidadania honorária não é um endosso político, mas um reconhecimento público a quem contribui para a sociedade, independentemente de ideologia”.
Outros vereadores se manifestaram, tanto a favor quanto contra a concessão do título. Rodrigo Marcial (Novo) informou ter alterado o voto para contrário, por considerar que a plataforma governamental de monitoramento de redes “criminaliza opiniões divergentes”. Já Éder Borges (PL) disse que não se opõe à orientação sexual do homenageado, mas criticou “o uso do STF para revogar leis locais”. “Nós vivemos um momento de insegurança jurídica, e isso é perigoso quando se usa o aparato estatal para cercear opiniões”, afirmou.
Por outro lado, Camilla Gonda (PSB) e Giorgia Prates – Mandata Preta (PT) defenderam a aprovação da homenagem. Gonda ressaltou que decisões judiciais que invalidam leis municipais são resultado do controle de constitucionalidade, “instrumento legítimo do Estado de Direito”. Já Giorgia Prates considerou que o debate demonstrou “a coragem de Toni Reis em enfrentar padrões e lutar por direitos humanos”, acrescentando que o Brasil “é o país que mais mata pessoas trans no mundo”.
Vanda de Assis (PT) também se manifestou favoravelmente à homenagem e ressaltou a importância do gesto simbólico da Câmara ao reconhecer a trajetória de Toni Reis. “Não estamos aqui apenas para um segmento, mas para toda a cidade; somos pagos para trabalhar em defesa de todos os curitibanos”, disse. A vereadora finalizou dizendo que a aprovação do título de cidadania a Toni Reis “mostra que o Legislativo não se deixa pautar pelo ódio, mas pelo diálogo e pelo reconhecimento de quem constrói uma Curitiba mais justa e plural”.